segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Melancolia



Chovera intensamente a noite toda. Pela manhã, as ruas e praças eram quase um charco. Os prédios pareciam bunkers e dentro deles almas melancólicas se entrincheiravam à espera de que o sol lhes viesse redimir. O sol não veio, e continuou chovendo - agora uma chuva modorrenta - durante todo o dia. A certa altura, como se fosse uma orquestra de loucos, as buzinas lá fora prenunciaram que a noite estava ali, à espreita. Pensei, "...e se ela me ligasse? Se ela me ligasse o sol, certa e mansamente, retornaria". "Quanta bobagem", concluí. Meu gato, em sua sabedoria elementar, de gato, depois de dormitar ao longo da tarde, indiferente à qualquer devaneio sobre ligações telefônicas em uma eventual conexão com o retorno do sol, veio roçar-se, maliciosamente, em minhas pernas.  "Ahá, também estas melancólico, né?!" . De súbito, entretanto, lembrei-me! A bem da verdade, o que Theo sentia não era bem melancolia. É que estava na hora de reabastecer a sua tigela de ração. Bem, pelo menos alguém, naquele apartamento soturno, não perdera de todo a sanidade.