sexta-feira, 26 de outubro de 2018

O sonho do trapezista



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Tudo já estava detalhado em seu plano de voo
O acrobata olharia bem fundo nos olhos do abismo
O medo seria apenas e tão somente um espectador estupefato
Suas narinas aspirariam os fragmentos da última  estrela
E assim,  pleno de universo solitário de si e na solidão da urbe adormecida 
Ele se lançaria... 
As mãos trêmulas mas resolutas tateariam frenéticas a escuridão
E no derradeiro átimo do iminente e previsível desfecho ele ainda conseguiria um vislumbre da primavera que se fora e da doçura indefinível daquele olhar que ela lhe dera   



sábado, 10 de março de 2018

Notícias improváveis de um velho jornal do interior




Resultado de imagem para impressionismo ventos e tempestades

Ventos fortes acompanhados de chuvas torrenciais se abateram ontem sobre a pequena cidade de Velha Esperança, no interior do país. O fenômeno da natureza obrigou o casal de namorados,  Artur e Beatriz, a se amar intensamente, por todo o dia e noite, isolados do resto da humanidade. Só um velho gato, de nome Theo, lhes fez companhia, e em suas pupilas registrou o episódio, para o caso de ainda existir alguém no universo que se interesse por crônicas prosaicas.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

O horizonte de eventos e a singularidade

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- Olá!
- Oi!?
- Você mora aqui? Eu preciso de uma informação.
- Não. Na verdade eu estou de passagem. Vim visitar um amigo que mora na cidade. 
- Ah! 
- Mas talvez eu possa te ajudar de algum modo...
- Bem, eu preciso chegar no... vamos ver... na Cidade Baixa.
- Ah, é fácil. Se tu não quiseres gastar muito com táxi podes ir de lotação. Posso te levar até o ponto, não fica longe.
- Obrigada. Mas não vou atrapalhar você?
- Não, fica tranquila. Opa! Venhas por aqui. A rodoviária fica um caos em véspera de feriadões. Todo mundo querendo sair da cidade. Ir para o litoral.
- Pois é! E nós no sentido contrário, chegando, enquanto quase todo mundo está partindo, rs.
- É mesmo. Mas sabe? Essa ideia de andar na contramão... às vezes é bem interessante, e não me incomoda. Ao contrário... rs
- rs. Eu também gosto dessa perspectiva. A contramão. Parece um fluxo que contraria o tempo e o lugar. De certo modo estamos indo para onde os retirantes deveriam, mas não vão estar, entende? Um lugar ao qual as pessoas recusaram o tempo.
- Hmmm! Há alguma coisa de teoria da relatividade aí, não há não? rs.
- ah, ah, ah, ah, ah. É, acho que tem um pouco sim.
- Bem, tudo o que eu consigo acessar sobre o tema é o que o Sabato disse no Uno y el Universo, e olha lá.     
- Não brinca? Eu adoro o Sabato. 
- Pois é. Tem a parte em que ele fala do eterno retorno, como se fosse uma paisagem permanente, um modo da repetição se realizar. E isso seria uma espécie de eternidade,  o que, convenhamos, se assemelha a uma maldição, naquela concepção do demônio de Nietzsche: "essa vida terá de vivê-la inúmeras vezes." 
- Claro! Por isso eu acho que a ideia da contramão subverte de algum modo um universo sem entropia, tedioso. Mas tem um preço. O risco de um acidente é sempre eminente.  
- Chegamos! Vou esperar até que a tua lotação chegue. 
- Que bom... Você... disse que está de passagem?!
- Ah, sim. Vou ficar umas duas semanas aqui em Poa. E tu?
- Eu? Bem, eu acho que vou ficar até o fim das férias. Estou dando um tempo.
- Que interessante! De certo modo eu também, estou dando um tempo.
- Que curioso. Nós dois nos encontramos aqui, no limiar do tempo, rs.
- rs, Verdade. Olha, a tua lotação chegou... 
-  ...
- Então... até...
- Mas é isso?! As coisas terminam aqui? Assim?
- Não... vou te acompanhar até a Cidade Baixa...
- Que alívio! Pensei que você me deixaria partir, assim!